domingo, 24 de outubro de 2010

Gabriela. Nem cravo, nem canela

É estranho ter o outro do lado de lá
Não que o lado de cá seja seco e sólido.
Tudo isso é muito complicado.
Essa coisa de ter que viver um dia depois do outro
E essa coisa de não querer ter mais nenhum dia pra viver
E de ter que existir a custa de uma imagem pseudônima
Que se reflete nos espelhos e nas vidraças,
E nas poças d’água...
Que se liquidifica e transborda pelo canto do olho
Escorre pelo rosto e perpassa o lábio
Até saltar da plataforma na fronteira do queixo
E despencar, rolando em cascata.

É estranho perceber que quando dói
É porque a gota já marcou o assoalho.
Aí o esquecimento se faz capaz de proteger,
E o rubro quente tomado por vodka embriaga.
As narinas farejam o líquido viscoso
E o calor se distribui em cada soluço.
Enquanto a mãe se lamenta
Supondo relações desvairadas
A pequena continua choramingando
Sugando um seio seco.

Cresce a possibilidade de ser,
De esquecer e resistir
E de não ser...
Uma massa branca movida a pontapés
De outras massas que brilham a custa dos teus olhos.

É tão esquisito. E desajeitado.
Quando se sabe que só saber já não alcança nada.
E não resolve. E não cura.
Porque Dois, agora são outros.
E Um, agora volta sozinho pra casa.
Onde nenhum deles esperava encontrar o outro, no início.

3 comentários:

  1. De volta, depois de um longo período de estiagem...
    Prometo tentar ser mais fiel a mim mesmo!

    ResponderExcluir
  2. Me alegro de encontrar-te aqui, de novo. Desde que você me disse que voltaria a postar, entrei todos os dias. Bom ver-te aqui, apesar do "ciclo seco" do texto, como diria Caio Fernando Abreu.

    Te amo.

    ResponderExcluir
  3. É, os dias passaram, as noites vieram e tudo se tornou escuro e sem sentido.
    Não havia sentido, não para mim.
    Eu não queria pensar ou fazer aquilo, mas existia uma força dentro de mim que era maior que qualquer outra coisa.

    Quando o peito dói, quando o coração chora, quando a alma se perde, não há o que fazer a não ser tentar sentir uma dor maior que amenize a primeira.

    Eu estava sem forças, estava sem chão.
    Estava perdida.

    Agora, enquanto escrevia esse comentário, minha mãe me deu a notícia de que minha nona foi para o hospital.
    São essas coisas, sabe, essa vontade de querer algo bom e só acontecerem coisas ruins que me deixa sem forças, que me deixa perdida.

    Meu dia termina aqui, como muitas outras vezes aconteceu... Não penso em acabar com meus dias hoje.
    Amanhã, quem sabe, eu volte a pensar nisso.
    E, se tudo continuar dando errado, meu plano será perfeito.
    O pôr-do-sol virá tão lentamente que ninguém vai sentir. E depois de ter se escondido no horizonte, ninguém sentirá falta do seu calor, pois ele foi congelando aos poucos para que, dessa vez, pudesse se por em paz.

    Eu sinto sua falta...
    Continue escrevendo, por favor.

    Com saudade,
    Gaby

    ResponderExcluir